“ Eram meados de
dezembro e o dia já estava quase no fim e eu me encontrava andando na areia da
praia,onde as ondas vinham beijar os meus pés.Era um momento idílico,e meus
pensamentos estavam tão longe...Pensava em como a vida pode nos apresentar
momentos tão contraditórios e em tão pouco tempo.Estava relembrando um episódio
que aconteceu com um amigo meu,que aprendi a conhecer,na minha infância...
Era um
garoto diferente dos demais,no seu jeito de proceder,de brincar e até nas
amizades que fazia.Não tinha muitos amigos e eu era,talvez,o seu melhor
amigo...Gostava de estudar e jogar futebol,mas nem sempre conseguia conciliar as
duas coisas,pois precisava trabalhar.Eu nunca o vi com uma menina e um
dia,quando estávamos vindo da escola,perguntei se ele não namorava alguma ,pois
tanto no colégio como na vila onde morávamos,havia algumas garotas que gostavam
dele...
Ele parou de
andar e eu continuei por uns metros e acabei parando também.Ele estava tão
concentrado que fiquei com medo de tê-lo contrariado,pois eu realmente me
identificava com ele e prezava a sua amizade...Não sei quanto tempo passou,mas
penso que foi uma eternidade,mas finalmente ele continuou a caminhar e passando
por mim,deu um sorriso meio de lado,que só vi ele fazer,quando estava sem
saída,em algum problema.Como o conhecia um pouco,caminhamos calados por um bom
tempo,pois sabia eu,que ele estava remoendo algum mistério e que,não demoraria
muito,eu ficaria sabendo...Chegamos na nossa rua e cada um foi prá sua casa,mas
antes de eu entrar,pedi desculpas por estar entrando em um terreno que não me
era permitido entrar.Ele apenas deu aquele seu sorriso de lado,meio torto,e
entrou em sua casa...
Era domingo e
quase dois dias haviam se passado,depois daquela nossa pequena conversa.A tarde
já estava alta e as meninas estavam nos chamando prá brincarmos de “Gosta
deste?”Eu disse que topava,mas ele,como sempre,disse que não e que ficaria
observando a brincadeira,porque ele era meu amigo e sempre estávamos juntos.
Entre as
meninas,havia uma garota muito meiga e linda,que chamarei de Ângela e que,num
certo momento da brincadeira,uma amiga dela estava tapando os meus olhos e me
perguntou o que eu queria daquela menina(eu não sabia quem era ela,pois estava
de costas e com os olhos tapados):Beijo na boca,abraço apertado ou um passeio
no escuro?Na minha indecisão,escolhi um passeio no escuro e então,peguei nas
mãozinhas da Ângela e fomos passear até a esquina,que por sinal,estava escuro
porque eu havia quebrado a lâmpada dois dias antes(Eu tinha o apelido de índio
e quebrava algumas lâmpadas a pedido de alguém que queria namorar no escuro.Sei
que era errado,mas eu fiz isso).Quando voltamos,sem querer eu vi que ele não
estava bem.Perguntei o que ele tinha e nada respondeu.Continuando a
brincadeira,a amiga dela estava perguntando;o que desejava do menino que ela
apontava e Ângela escolheu um abraço apertado.O garoto a abraçou e apertou um
pouco mais do que o normal e novamente e sem querer,eu percebi que ele não
gostou e me disse que ia embora.Sai correndo atrás dele e quando o alcancei,perguntei
o que tinha acontecido e ao parar e me olhar de frente,vi que seus olhos
estavam úmidos e mais tristes do que eu me lembrava.Então,entendi tudo...Ele
amava a Ângela!
Eu ainda não
sabia o que era gostar de alguém assim,mas entendi que era algo mais forte e que muitos homens não
conseguiam suportar amar alguém que nem conseguia perceber quanta ternura o meu
amigo tinha por ela...Fiquei olhando prá ele e não sabia como ajudá-lo,tentei
falar algo,mas percebi que só ia falar besteiras e em vez de ajudar,só faria
aumentar a dor do meu amigo.Mas como ajudá-lo,se eu nada sabia deste tal de
amor?
Quando estávamos
no portão da casa dele,perguntei se ela sabia que ele gostava dela e ele apenas
balançou a cabeça em negativa...Sorrindo meio torto e de lado,me respondeu que
não tinha voz,quando estava perto dela e entrou em sua casa.
À noite,deitado
em minha cama,dei risadas sozinho;Como é que um homem fica sem voz ao estar
perto de uma menina?Eu não acreditei naquela bobeira e somente mais tarde,eu
entedi o que ele havia sentido...Meu amigo sabia o que era estar perdido em
sentimentos!
Alguns meses se
passaram e o fim de ano estava chegando.Eu nunca mais toquei no assunto com meu
amigo,por não querer vê-lo triste.Mas sempre observava como ele olhava prá
Ângela e sabia que só ia acabar com aquela agonia,se eles conversassem à
respeito do sentimento em jogo.Insisti e ele resolveu falar com ela,mas que
seria do jeito dele...
Como estávamos
de férias escolares,eu trabalhava durante o dia e somente à noite é que eu
teria condições de encontrar o pessoal e quando perguntava pelo meu amigo,sua
mãe me dizia que ele não estava...Então ficamos quase uma semana sem nos
falarmos e sem saber do resultado da tão esperada conversa entre o meu amigo e
a Ângela...
No sábado à noite,depois que voltei do meu
trabalho,eu o vi no barzinho da vila e quando cheguei,ele me convidou prá
jogarmos umas partidas de sinuca...Eu brincando com ele,disse que topava,mas só
se eu pagasse,pois de nós dois alí,eu era quem perdia as partidas...Enquanto
ele pegava as fichas,eu pedi duas coca-colas e começamos a jogar e ele,como
sempre,estava calado...Quando eu ia perguntar alguma coisa,ele respondia logo
que eu o estava desconcentrando!Este meu amigo é muito esperto,sabia que eu o
estava procurando fazia dias e ele estava brincando com a minha
curiosidade!Danado!
O jogo acabou e
como sempre;eu havia perdido prá ele!saímos andando e eu perguntei como tinha
sido a conversa com a sua amada e ele,sem olhar prá mim,disse que ela não
gostava dele...Eu não sabia o que poderia dizer naquele momento e só pensei em
como ele estava mais confiante do que na primeira vez que o interpelei,nesta
questão de estar namorando alguma menina...Alguns minutos se passaram e ele me
disse que contra a vontade da pessoa escolhida,não há amor que possa resistir
ao tempo da solidão, e mesmo que resista ao tempo da perda,quem poderá
restituir a dor?Quem poderá dizer que
tudo ficará bem?Ela é apenas uma parte do meu sonho lindo,que nem tive chances
de sonhar direito!Continuei andando e
parece que nunca vou parar de andar por esta vida cheia de desencontros...
Ângela,depois
de uns anos,se apaixonou por um rapaz e estão casados.Já o meu amigo,de vez em
quando,encontro com ele!Ainda somos amigos e acho que nunca deixamos de ser!Nem
sempre vejo tristeza em seus olhos,pois muitas águas se passaram por debaixo
das pontes e nem sei se ele ainda sonha...!”
05/11/2012
Nilo Mendes.
